As doenças lisossômicas são causadas por uma alteração genética que resulta na ausência ou deficiência de uma enzima, levando ao armazenamento inadequado de material em várias células do corpo. A maioria dessas doenças é herdada (passada dos pais para seus filhos) de forma autossômica recessiva (quando para uma doença ocorrer, é preciso que a pessoa herde o gene alterado do pai e, também, o gene alterado da mãe – nessa situação, caso cada um dos pais só tenha um gene alterado, eles não têm sintomas da doença, mas carregam a alteração e podem passar para seus filhos(as), sendo chamados de portadores).
Embora a maioria dos distúrbios de armazenamento lisossômico siga um padrão de herança autossômico recessivo, há exceções. A doença de Fabry e a síndrome de Hunter seguem um padrão de herança recessivo ligado ao cromossomo X (sexual), em que filhos do sexo masculino e do sexo feminino têm chances diferentes de ter a doença.
Sinais e sintomas das doenças lisossômicas?
Embora os sinais e sintomas variem de doença para doença nesse grupo, os sintomas ocorrem em cada caso por causa de uma deficiência de enzimas que impede que os lisossomos presentes nas células do corpo realizem sua função normal. Quando isso ocorre, o substrato (molécula que deveria ser degradada) começa a se acumular nas células de forma progressiva, surgindo, assim os sintomas.
Uma vez que há um grande número de doenças que fazem parte do grupo das lisossômicas, e todas são de grande complexidade, uma variedade de sintomas pode estar presente, como:
Cada doença lisossômica tem particularidades de sintomas que são abordadas no texto específico de cada doença.
Como é feito o diagnóstico de doenças lisossômicas?
Antes do surgimento dos sintomas:
O diagnóstico precoce, pouco tempo depois do nascimento, antes mesmo do surgimento dos sintomas, é possível para algumas doenças lisossômicas, como doença de Gaucher, doença de Pompe, doença de Fabry e mucopolissacaridose tipo 1. A detecção precoce, assim como para outros erros inatos do metabolismo, ocorre geralmente por meio de exames de triagem, como o Teste do Pezinho, que avalia alterações no funcionamento do metabolismo.
Detectar e diagnosticar precocemente é muito importantes porque quando as terapias estão disponíveis, seja para a doença em si ou para os sintomas associados, elas podem limitar significativamente o curso e o impacto da doença na qualidade de vida das pessoas acometidas, bem como de sua rede de apoio – família e amigos.
*Atualmente, o Teste do Pezinho oferecido pelo SUS ainda não contempla nenhuma das doenças lisossômicas, mas a Lei Federal 14.154 aprovada em 2021 incluirá exames para triagem de doenças lisossômicas como mucopolissacaridoses, ainda sem data determinada pelo Ministério da Saúde para acontecer.
Depois do surgimento dos sintomas:
Pessoas que não são triadas quando recém-nascidas, ou cujas doenças lisossômicas ainda não têm possibilidade de detecção precoce, geralmente vivem uma longa jornada até o diagnóstico final.
Tudo começa com um diagnóstico clínico, ou seja, com a avaliação médica das alterações apresentadas pelo paciente, então, pensando em um erro inato do metabolismo ou diretamente em uma doença lisossômica, o médico solicita exames para confirmar o diagnóstico. Geralmente solicitam-se exames de sangue e de urina especializados (moleculares e genéticos), bem como exames de imagem (raio-x, tomografia, ressonância).
As doenças lisossômicas têm algum tratamento?
Sim, as doenças lisossômicas sempre têm tratamento a ser feito.
Primeiramente, é importante mencionar que cada erro inato do metabolismo tem sua particularidade de tratamento, de sintomas, de limitações e de evolução, assim como o grau de comprometimento das funções varia de paciente para paciente, inclusive dentro de uma mesma condição.
De maneira geral, mesmo quando não há um tratamento definitivo (de cura) para a doença há muito o que fazer para melhorar a qualidade de vida e a independência desses pacientes, afinal, incurável não quer dizer intratável. Por isso pessoas com doenças lisossômicas requerem cuidado interdisciplinar e, idealmente, o acompanhamento deve ser realizado em um centro de referência.
O tratamento não específico pode envolver:
Tratamento clínico com introdução de equipamentos para:
- Auxiliar na nutrição adequada (sondas) – vencendo a dificuldade de engolir que o paciente possa ter;
- Melhor qualidade da respiração (C-PAP) – mantendo vias aéreas livres de secreção e os pulmões expandidos;
Tratamento cirúrgico com acompanhamento ortopédico, neurológico, oftalmológico, etc.;
Fonoterapia - diagnóstico e tratamento de dificuldades para engolir e falar;
Fisioterapia:
- Exercícios físicos adequados e especificamente indicados para o caso do paciente. Lembre-se: o que ajuda um, pode não ajudar o outro;
- Exercícios respiratórios para melhorar o funcionamento dos pulmões;
Terapia ocupacional: adaptações que melhoram a funcionalidade do paciente e a realização de atividades de vida diária, como autocuidados e trabalho.
Psicoterapia para apoiar e orientar o paciente e as pessoas da sua rede de suporte (família e cuidadores) no enfrentamento das adversidades.
O tratamento específico de doenças lisossômicas envolve estratégias que incluem:
Transplante de células tronco-hematopoiéticas;
- Terapia de reposição enzimática;
- Transplante de órgãos;
- Diálise;
- Uso de inibidores da síntese de substrato;
- Depleção de substrato acumulado;
- Etc.
*A terapia gênica é realidade em alguns estudos clínicos para algumas doenças metabólicas específicas, porém ainda não está disponível no Brasil.*
As doenças lisossômicas são doenças raras?
Cada uma das mais de 50 doenças consideradas do grupo das doenças lisossômicas é rara, pois tem uma frequência baixa na população, menor que 65 pessoas a cada 100.000 (definição de doença rara segundo a OMS).
Porém, quando somadas em todo o mundo, alguns autores estimam que doenças lisossômicas tenham uma frequência estimada de cerca de um em cada 4.000 a 9.000 nascidos vivos, ou seja, em conjunto, as doenças lisossômicas afetam muitas pessoas ao redor do mundo.
Então, é importante ressaltar que embora sejam consideradas raras, elas têm uma importância muito grande na saúde global.
Quais são as doenças lisossômicas?
1) Andrade LA. Doenças de Armazenamento Lisossômico e seu Impacto na Função Respiratória: O Papel da Fisioterapia Respiratória como Tratamento Coadjuvante – Revisão da Literatura [Trabalho de Conclusão de Curso - Internet]. Ribeirão Preto: Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo – USP; 2017 [acessado 7 Jun 2022]. 22 p. Disponível em: https://ses.sp.bvs.br/wp-content/uploads/2017/07/PAP_Leonardo-Al%C3%A9cio-de-Andrade_2017.pdf Programa de Aprimoramento Profissional/CRH/SES-SP.
2) BMJ Best Practice [Internet]. Londres: BMJ Publishing Group; 2021 Oct 26. Doenças do armazenamento lisossomal hereditárias comuns; [revisado 4 Jun 2022; acessado 7 Jun 2022]; Disponível em: https://bestpractice.bmj.com/topics/pt-br/1021/.
3) Mehta A, Beck M, Sunder-Plassmann G, editors. Fabry Disease: Perspectives from 5 Years of FOS [Internet]. Oxford: Oxford PharmaGenesis; 2006. 2, Epidemiology of lysosomal storage diseases: an overview; [acessado 7 Jun]; Disponível em: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/books/NBK11603/.
4) NORD (National Organization for Rare Disorders) [Internet]. Connecticut: National Organization for Rare Disorders; 2003-2006. Lysosomal Storage Disorders; [acessado 25 maio 2022]. Disponível em: https://rarediseases.org/rare-diseases/lysosomal-storage-disorders/.